Passava de 1h da
madrugada e o cansaço de três noites em claro pesava, quando o
negociador-chefe do Brasil, Luiz Alberto Figueiredo, se deparou com o
ministro britânico de Energia e Clima, Chris Huhne, na plenária.
Figueiredo
sugeriu meio termo em documento para conseguir
consenso
final para aprovação de acordo
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Já era domingo, segundo dia de prorrogação da reunião das Nações
Unidas sobre mudanças climáticas na África do Sul, ainda sem conclusão à
vista, e o clima pesou.
Huhne, ex-jornalista e atual
deputado liberal-democrata, e Figueiredo, ex-comunista e atual
diplomata, trocavam acusações polidas e mútuas de estarem pondo em risco
todo o trabalho de mais de duas semanas em Durban.
O pomo da discórdia era uma nova versão do texto
final a ser adotado pela convenção do clima, mais precisamente a
descrição do valor legal dele.
Metas de redução
Pela primeira vez na história das negociações
sobre o clima, países em desenvolvimento estavam prestes a se
comprometer legalmente com metas de redução de emissão de gases do
efeito estufa.
Desde a década de 90, a legislação climática
separava o mundo entre países desenvolvidos, com obrigações de redução, e
países em desenvolvimento, livres de compromissos com força de lei.
No século 21, com a disparada de crescimento da
China, seguida por Índia e Brasil, essa divisão ficou cada vez mais
incômoda para os Estados Unidos (que embora nunca tenha assumido metas
de redução, continuou participando do processo internacional da ONU) e
para a União Europeia.
A solução para eles era fechar um acordo que
igualasse todos os participantes perante à lei, ainda que com
compromissos diferentes.
China e Índia, entretanto, embora tivessem
aceitado negociar um acordo assim para o futuro, não estavam satisfeitos
com o que lhe caberia nessa barganha: uma nova etapa do Protocolo de
Kyoto (que vence em 2012) e um acordo que finalmente incluísse os
Estados Unidos, entre outros.
Não era de se estranhar, portanto, que estes países quisessem enfraquecer ao máximo este novo futuro vínculo legal.
'Momento histórico'
Ministro
britânico Chris Huhne insistia em vínculo
legal mais
forte para compromissos de cortes
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Na plenária, já cercado por uma pequena
multidão, o inglês reclamava da nova versão que continha a expressão
"resultado legal" no lugar de "instrumento legal" - como aparecera em
versões anteriores.
Negociadores europeus, no burburinho que se
formou em torno dos dois, diziam que não podiam simplesmente aparecer
com um texto e querer jogar fora o que fora negociado anteriormente e
ameaçavam abandonar navio.
Figueiredo, que durante as duas semanas de
COP-17 não raro fez o papel de intermediário entre os chamados BASIC
(Brasil, África do Sul, Índia e China) e os Estados Unidos e UE, tratou
de defender a mudança.
"Eu estava tentando fazer ver a todos que por
uma palavra não se perde um momento histórico", disse Figueiredo depois
do final feliz.
Na hora, visivelmente irritado, respondeu em
inglês a Huhne: "Não me venha com essa, isso você pode dizer fora daqui,
mas não me venha com essa", dando a entender que não aceitaria qualquer
"jogo de cena" em uma hora tão crucial para as negociações.
Afastou-se e de longe, conversava com outro representante brasileiro, ainda abalado, enquanto Huhne articulava.
"Então, temos nós que falar com a Índia", dizia.
Negociadores europeus lhe responderam que não faria diferença - a Índia
não mudaria de posição.
"Temos que tentar", respondeu Huhne, enquanto a
presidência da COP-17 pedia aos delegados que tomassem seus assentos
para a retomada dos procedimentos.
A sessão foi reaberta, mas não por muito tempo.
Novamente, a UE pediu tempo para conversar. Dessa vez, os dez minutos se
transformaram em quase uma hora de intensas conversas.
Solução intermediária
Figueiredo desapareceu em uma nuvem de negociadores da Índia e da UE.
De volta à plenária, item a item, a agenda foi aprovada, sem sinal das tensões presenciadas havia pouco.
A explicação? Na dúvida entre "resultado legal" e
"instrumento legal", o embaixador Figueiredo saiu-se com "instrumento
com força legal".
Em entrevista coletiva após a aprovação do novo
período de compromisso sob Kyoto, do Fundo Verde do Clima, do texto
sobre REDD e outros, além, é claro, principalmente o novo instrumento
legalmente vinculante, Huhne era só elogios.
"Luiz é um advogado criativo e imaginativo e um
grande parceiro de negociações, e o Brasil tem um histórico de
conquistas incrível que está cada vez mais sendo projetado no âmbito
internacional", disse o ministro.
Para a comissária europeia, Connie Hedegaard, foi o momento definitivo das longas duas semanas de negociação.
"E acho que se não tivéssemos encontrado aquela
solução com a Índia naquele momento, estaríamos naquela sala até agora
ou nada teria saído daqui."
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