Uma "empresa de informática pequeninha", nas palavras do próprio
ministro da Indústria, Desenvolvimento e Comércio Exterior, Fernando
Pimentel (PT), pagou R$ 400 mil pelos serviços da P-21 Consultoria e
Projetos Ltda, empresa mantida pelo petista entre sua saída do comando
da prefeitura de Belo Horizonte, em 2009, e a chegada ao governo
federal, em 2011. Firma especializada em "cabeamento estruturado para
rede de computadores", a QA Consulting Ltda pertence a Alexandre Allan,
de 36 anos, e Gustavo Prado, de 35, filho de Otílio Prado, sócio
minoritário de Pimentel na P-21 Consultoria.
O
pagamento pela consultoria de Pimentel se deu em duas parcelas de R$
200 mil. A primeira foi paga em 19 de fevereiro de 2011, dois dias
depois de a QA Consulting receber R$ 230 mil da construtora HAP
Engenharia para prestar serviços de "infraestrutura para soluções de
rede". A título de tributação, o serviço foi declarado como de
engenharia civil mas, segundo o Conselho Regional de Engenharia,
Arquitetura e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG), não há registro de
Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) referente ao serviço alegado
pela empresa. A segunda parcela foi paga em maio de 2010.
Construtora acusada de desviar recursos
A
HAP é velha conhecida de Fernando Pimentel: em maio deste ano, o
ex-prefeito de Belo Horizonte tornou-se réu em ação civil pública ao
lado do dono da empresa, Roberto Senna. A construtora é acusada de
superfaturar obra da prefeitura de Belo Horizonte em R$ 9,1 milhões e de
desviar recursos para a campanha de Pimentel em 2004, quando o petista
disputou a reeleição para a prefeitura da capital mineira. Na época,
Pimentel contratou sem licitação a Ação Social Arquidiocesana (ASA), da
Arquidiocese de Belo Horizonte, para construir 1,5 mil casas. A entidade
subcontratou a HAP, e o custo da obra passou de R$ 12,7 milhões para R$
26,7 milhões. Segundo o Ministério Público, metade das casas não foi
entregue. O processo corre na 4ª Vara da Fazenda Pública Municipal de
Belo Horizonte.
A QA Consulting é a terceira maior cliente da
consultoria de Pimentel, que em dois anos faturou R$ 2 milhões. Conforme
mostrou O GLOBO no domingo, a Federação das Indústrias do Estado de
Minas Gerais (Fiemg) pagou R$ 1 milhão por serviços ao ministro, e a
construtora mineira Convap, outros R$ 514 mil, meses antes de abocanhar
em consórcio R$ 95,3 milhões em contratos no governo do aliado de
Pimentel, Márcio Lacerda (PSB). A QA pagou R$ 400 mil pela consultoria
de Pimentel, apesar da sua peculiar situação financeira: de acordo com a
Junta Comercial de Minas Gerais, está enquadrada como microempresa
(faturamento anual de, no máximo, R$ 360 mil, de acordo com a nova
legislação).
Procurado na segunda-feira de manhã na sede de sua
empresa, o sócio Gustavo Prado não quis dizer se haviam contratado
Pimentel. Também se recusou a dar qualquer detalhe a respeito dos
serviços prestados pelo ministro à sua pequena empresa. Disse que se
pronunciaria apenas por e-mail e pediu ao repórter que se retirasse. À
tarde, enviou e-mail dizendo que Pimentel havia prestado serviços de
"consultoria econômica" e que a empresa teria perfeita "capacidade
econômico-financeira para custear a consultoria contratada". Mas não
quis dizer qual foi o faturamento de sua empresa em 2009 e 2010,
alegando se tratar de informação estratégica.
Sobre a contratação
de seus serviços pela HAP, Prado disse não ter registrado ART no CREA-MG
porque, em sua opinião, "o serviço não era de relevância e nem houve
exigência do cliente".
- Os serviços foram corretamente declarados
às autoridades fiscais, tendo sido realizado em mais de um
estabelecimento da empresa - afirmou Prado.
Ao ser questionado
sobre o enquadramento como microempresa, a QA Consulting atribuiu a
situação a um erro do escritório de contabilidade que presta serviço
para eles e informou que, na prática, já teria alterado o formato de
pagamentos de impostos pela empresa.
O GLOBO também procurou na
segunda-feira o empresário Gustavo Henrique Duarte, que foi sócio da QA
Consulting entre a consultoria de Pimentel, em 2009, e o início deste
ano, quando ele deixou a empresa.
- Eu não cuidava da parte
administrativa, não posso falar nada sobre isso - disse, ao desligar o
telefone e não mais atender as ligações do GLOBO durante a tarde de
ontem.
O dono da HAP Engenharia, Roberto Senna, informou, por meio
de sua assessoria, que as instalações de cabeamento da QA Consulting na
sua construtora foram adequadamente executadas e negou ter usado a
empresa do filho do sócio de Pimentel para transferir recursos ao
ex-prefeito de Belo Horizonte, de quem sempre se declarou amigo
publicamente. "Não existe nenhuma relação entre estes serviços e
eventual contratação, pela QA Consulting, de serviços de terceiros,
inclusive de eventual contratação de empresa de consultoria do ministro
Fernando Pimentel", escreveu a assessoria de Senna na nota oficial.
Na
ação civil pública em que Senna é réu ao lado de Pimentel, o Ministério
Público questiona a proximidade dos dois, em especial a doação de R$
235 mil à campanha de Pimentel pela reeleição em 2004. Laudos periciais
solicitados pelo Ministério Público levaram o órgão a sustentar que o
valor doado seria parte de uma parcela de R$ 1,2 milhão repassada pela
prefeitura à ASA e, consequentemente à HAP, 11 dias antes do registro da
doação. No processo, os advogados de Pimentel classificaram a acusação
como "ilação do Ministério Público".
PSDB pretende convocar ministro
Os
petistas saíram em defesa de Pimentel, e descartaram a possibilidade de
o ministro vir a ser o próximo da lista a ser bombardeado pela oposição
no Congresso. A oposição, porém, considerou insuficientes as
explicações dadas por Pimentel. O PSDB entra hoje, na Comissão de
Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, com pedido de convocação
do ministro.
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